Nocturn Diem - Jéssica Banstarch
- Jéssica Banstarch
- 18 de abr. de 2019
- 2 min de leitura

- Ótimo, a cafeteira queimou!
Sentou-se desanimado na cadeira amarela ao lado do telefone, pois naquela noite especificamente, Richard estava cansado demais para ampliar seu vocabulário de xingamentos. O dia como sempre não fora produtivo, acordou por volta das 4 horas da tarde, e não pensara em nada mais criativo do que "Porcaria" para definir o dia.
Depois de tomar um café frio que restava na garrafa, pegou suas câmeras e seguiu a rota traçada no GPS, rumo a mais uma sessão de fotografias.
A única rotina que seguia fielmente era de mal dizer o dia sempre ao acordar, isso lhe dava ânimo para buscar novas experiencias e ser surpreendido se algo de bom acontecesse.
Enviou o trabalho para um cliente hipster que insistia em que chamar de "irmão".
- Nós não estamos sozinhos nesse universo.
As coisas boas de ser um night owl são o silêncio, a (quase) total solidão, e a liberdade. E as ruins são a falta dessas coisas, pois alguns diurnos rebeldes ousam romper o silêncio e a solidão, com suas bebedeiras e gritarias, e não aproveitam verdadeiramente a noite. Acabam por estragar os preciosos minutos de sua beleza.
A noite brilha, e se colore com as mais belas cores das galáxias, e de trilha sonora os animais noturnos, seus olhos refletem a luz que recebem e nos impressionam pela independência e sabedoria.
O ódio de Richard pelo dia não era um ódio verídico, era entretenimento, o sol não tinha culpa da frustrações diárias dele.
Richard passou a morar sozinho e criou a própria regra de não ter regras, passara quase 10 anos da vida no Japão com sua banda, e desde voltou a noite era sua companhia, acordava às vezes pela manhã, mas se não estivesse totalmente escuro não levantava da cama nem por uma fortuna.
No início usava a desculpa do fuso horário, mas na verdade gostava muito da sensação de ser o único humano acordado na Terra.
Todas suas grandes ideias foram fruto de noites não dormidas, dizem por aqui que as mentes criativas são as que mais sofrem.
Dia desses, numa das caminhadas pelo bairro encontrou a Louis, sua nova companhia que surpreendentemente se adaptou a rotina noturna do dono. Encontrar uma alma mais perdida que a sua e poder ajuda-la se tornou o objetivo de vida de Richard.
Inspirado na simetria dos becos e na falta de espaço da cidade, ganhou um prêmio pelo trabalho, o que não o afetou emocionalmente. Vestiu uma roupa qualquer que já havia usado, prendeu os cabelos e assim foi receber a homenagem do pequeno grupo de admiradores de paisagens urbanas.
O dia amanheceu chuvoso e monótono como Richard gostava. O alerta de novo e-mail acordou Louis que foi até o banheiro e depois caminhou silenciosamente pelo corredor, subiu na cama e deitou ao lado do corpo do seu dono, sem se importar com o frio.
Comments